A reforma trabalhista, que completa três anos nesta quarta-feira (11), trouxe modificações nas relações de trabalho, porém, ainda esbarra em questionamentos na Justiça, trazendo insegurança jurídica para colocar todas as mudanças em prática. E a criação de vagas com carteira assinada ainda está aquém da prevista.

O número de reclamações trabalhistas caiu nas Varas de Trabalho, assim como os pedidos de danos morais, devido a mudanças que encareceram os custos para os trabalhadores em caso de perda da ação e pela limitação no valor dos pedidos de indenização, respectivamente.

Já o trabalho intermitente e as demissões por comum acordo, novidades trazidas pela reforma na forma de contratar e de demitir, apesar de terem registrado crescimento, ainda registram adesão abaixo do esperado.

O governo informou ao G1 que a nova lei trabalhista agiu, sobretudo, em questões relacionadas à segurança jurídica dos contratos de trabalho, pois se trata de uma “modernização capaz de proporcionar maior conformidade aos contratos de trabalho, para que trabalhadores e empregadores pudessem ter mais certeza a respeito de seu cumprimento”.

Mas reconhece que “a reforma não agiu sobre os custos diretos do emprego, o que ainda é um desafio estrutural da economia brasileira, para inclusão de dezenas de milhões de pessoas no mercado de trabalho formal”.

“A continuidade da geração de empregos de forma perene, ao longo de um período maior, se dará em função da retomada de atividade econômica, da manutenção da segurança jurídica nas relações de trabalho e das medidas legislativas aderentes a um cenário de reformas que possibilitem, à economia, maior produtividade e empregabilidade”, informou ao G1.

Veja abaixo os principais efeitos da reforma trabalhista após três anos:

Reforma não gera os empregos esperados

A expectativa do governo era de que a reforma trabalhista gerasse empregos formais. Após três anos com saldo negativo, o país voltou a criar vagas com carteira assinada em 2018 e 2019, mas abaixo do volume dos anos anteriores à crise econômica. Neste ano, por causa da pandemia, foram fechadas quase 560 mil vagas até setembro. Veja abaixo:

De acordo com o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), no período entre novembro de 2017 e setembro de 2020, foram gerados 286,5 mil postos de trabalho, bem abaixo da previsão do governo anterior, de gerar mais de 6 milhões de empregos no país.

Já o desemprego segue persistente e em nível recorde, agravado pela pandemia. No trimestre encerrado em agosto, a taxa medida pelo IBGE ficou em 14,4% – a maior já registrada na série histórica da pesquisa, iniciada em 2012. Em comparação com a registrada no trimestre encerrado em novembro de 2017, quando a nova lei trabalhista passou a valer, são 2,4 pontos percentuais de aumento.

Além disso, enquanto em novembro de 2017 havia 12,6 milhões de desempregados, em agosto deste ano, o número bateu 13,8 milhões.

64% das vagas foram para intermitentes

A reforma trabalhista criou a modalidade de trabalho intermitente, que é uma prestação de serviços em períodos alternados, em que o trabalhador é remunerado de maneira proporcional, somente pelo período trabalhado. Além disso, a prestação de serviços esporádica deve ser registrada em carteira e há direitos trabalhistas previstos, como férias e 13º proporcionais e depósito do FGTS.

Desde a entrada em vigor da nova lei trabalhista, em novembro de 2017, até setembro deste ano, foram criadas 185,5 mil vagas na modalidade de trabalho intermitente, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério da Economia. O número de postos gerados representa 64,7% do total de vagas criadas no mesmo período no país (286,5 mil). Cerca de 70% dessas vagas foram abertas nos setores de comércio e serviços.

Em 2018, foram 51.183 vagas intermitentes, quase 10% do total de 529 mil postos criados. Em 2019, o número saltou para 85.716 vagas, 13,2% do total de 644 mil postos.

Já neste ano, enquanto o país fechou 558,6 mil postos de trabalho até setembro, na modalidade intermitente foram geradas 42.532 vagas.

O saldo de vagas da modalidade (contratações menos demissões) foi positivo em todos os meses até agora, com exceção de abril, quando as atividades estavam paralisadas no país devido à pandemia de Covid-19. Cenário diferente do total de vagas formais, que chegou a registrar quedas bruscas em alguns momentos, como em abril, quando o país fechou o total de 927,6 mil vagas, o pior resultado da série histórica da Secretaria Especial de Trabalho e Previdência do Ministério da Economia, que tem início em 1992 – veja abaixo:

Ainda assim, até agora, as contratações na modalidade estão bem abaixo da expectativa divulgada pelo governo na época da criação do trabalho intermitente, de criar 2 milhões de empregos em 3 anos, ou 55 mil vagas por mês.

Para o governo, esse tipo de contrato tem se mostrado relevante, pois permitiu uma opção a mais de formalização para o trabalhador, bem como adequação às distintas realidades de produção e atividade.

Demissão por acordo tem baixa adesão

A demissão por acordo, uma das novidades trazida pela reforma trabalhista, registrou 524.308 desligamentos de novembro de 2017 a setembro de 2020, envolvendo 160.156 empresas – dentro de um total de 44,14 milhões de demissões no período.

Nessa modalidade, o empregado que pedir para sair da empresa poderá negociar com o patrão o direito a receber metade da multa de 40% sobre o saldo do FGTS e metade do aviso prévio. O empregado poderá ainda movimentar até 80% do valor depositado na conta do FGTS. No entanto, não tem direito ao seguro-desemprego.

Em 2018, foram registradas 165.184 demissões por acordo, de um total de 14,94 milhões de desligamentos no país, segundo dados do Caged. Já em 2019, o número de acordos subiu para 220.579, de um total de 15,55 milhões de demissões. Neste ano, até setembro, o número está em 131.343, de um total de 11,17 milhões de desligamentos.

Essas demissões por acordo equivalem a menos de 2% do total dos desligamentos ao mês. Veja no gráfico abaixo:

Reforma inibe queixas trabalhistas

A nova lei trabalhista trouxe mudanças para o trabalhador que entra com ação na Justiça contra o empregador. Entre as mudanças estão pagamento de custas processuais em caso de faltas em audiências, de honorários dos advogados da parte vencedora e de provas periciais em caso de perda da ação, além de ser obrigatório especificar os valores pedidos nas ações.

Outra mudança foi o pagamento de multa e indenização em caso de o juiz entender que o empregado agiu de má-fé.

Na prática, o processo ficou mais caro para o empregado, o que inibiu pedidos sem procedência. Essa tendência é mostrada nos dados fornecidos pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

O número de processos novos nas Varas de Trabalho teve queda de 34,2% entre 2017 e 2018. Em novembro de 2017, quando a lei entrou em vigor, houve um pico no número de novas ações, totalizando quase 290 mil, o maior número entre todos os meses de 2016 e 2017. Já em dezembro de 2017, o número caiu para 84,2 mil novos processos.

Desde então, o número de ações não voltou aos mesmos patamares dos anos anteriores, de mais de 200 mil processos ao mês. Desde a reforma trabalhista, o maior número de processos foi em maio de 2019: 173.655. Apesar de em 2019 ter havido um ligeiro aumento de 5,2% no total de ações em relação a 2018, o número de processos não voltou ao patamar de mais de 2 milhões de ações ao ano.

Comparando os dados de janeiro a setembro, enquanto em 2017 o número de ações passava de 2 milhões, neste ano ficou em um pouco mais de 1 milhão – queda de quase 50%.

Pedidos por dano moral recuam

A reforma trabalhista impôs limite aos valores dos pedidos de indenização por dano moral, que passou a ser de no máximo 50 vezes o último salário do trabalhador. Além disso, se o juiz entender que houve má-fé, o autor da ação pode ser multado em 10% do valor da causa.

Com isso, o número de pedidos relacionados a danos morais despencou, segundo dados fornecidos pelo TST. Entre 2017 e 2018, a queda foi de 58,6% – passou de 755,6 mil processos para 312,6 mil. Entre 2018 e 2019, houve um ligeiro aumento de 3,3%. Neste ano, até setembro, são 200,2 mil ações referentes ao tema. No ano passado, no mesmo período, foram 244 mil ações novas.

Em dezembro de 2017, o número despencou para 14,9 mil ações – queda de 81% em relação a novembro do mesmo ano (79 mil). Os números, que se mantinham nos patamares de 60 e 70 mil ações ao mês em 2016 e 2017, não passam de 30 mil desde 2018.

Além disso, a proporção das ações por dano moral dentro do total de processos oscila entre 17% e 19% desde que a lei entrou em vigor. Antes da reforma, a proporção ficava entre 23% e 33% do total.

Ações que reduzem direitos estão paralisadas

Desde outubro do ano passado, estão suspensas pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) as ações trabalhistas que tratam de redução de direitos não previstos na Constituição por meio de acordos coletivos, colocando em jogo a prevalência da negociação sobre a lei, uma das premissas da reforma.

A reforma trabalhista prevê que a negociação entre empresas e trabalhadores prevalecerá sobre a lei em pontos como parcelamento das férias, flexibilização da jornada, participação nos lucros e resultados, intervalo, trajeto até o trabalho fora da jornada, banco de horas e trabalho remoto. No entanto, benefícios como FGTS, salário mínimo, 13º salário, seguro-desemprego e licença-maternidade não podem entrar na negociação coletiva por estarem na Constituição.

A questão veio à tona porque é questionado se esses acordos coletivos acabarão sendo desvantajosos para os trabalhadores, como o trajeto até o trabalho não computado como jornada. Agora, é aguardada uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema. O caso começou a ser julgado no plenário virtual no dia 6 de novembro, mas o julgamento foi suspenso por um pedido de destaque da ministra Rosa Weber.

Um dos pontos que gerou insegurança no meio jurídico foi se a reforma valeria também para os contratos de trabalho antigos, celebrados antes das mudanças. Em junho de 2018, instrução normativa do Tribunal Superior do Trabalho (TST) estabeleceu que só os novos contratos devem ser submetidos à reforma.

Arrecadação sindical despenca

Antes da reforma, o recolhimento da contribuição dos trabalhadores aos sindicatos era obrigatório e descontado na folha de pagamento. O valor, equivalente ao salário de um dia de trabalho, retirado anualmente na remuneração do empregado, era direcionado para a manutenção do sindicato da categoria.

Com a nova lei trabalhista, o pagamento da contribuição sindical não é mais obrigatório. A empresa só pode fazer o desconto com a permissão do empregado.

Com isso, a arrecadação sindical (somando centrais, confederações, federações e sindicatos) caiu drasticamente de 2017 para 2018, segundo informações da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, passando de R$ 2,038 bilhões em 2017 para R$ 283 milhões em 2018. Em 2019, a arrecadação caiu ainda mais, para R$ 89 milhões.

Apesar da queda na arrecadação, o número de sindicatos no país teve um ligeiro crescimento entre 2017 e 2019:

2017: 16.713
2018: 16.873
2019: 17.054
2020 (jan e fev): 17.119
Em junho de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) negou os pedidos para tornar novamente obrigatório o pagamento da contribuição sindical pelos trabalhadores. A Corte analisou 19 ações diretas de inconstitucionalidade de entidades sindicais contra a regra da reforma trabalhista que tornou o repasse facultativo, em que cabe ao trabalhador autorizar o desconto na remuneração.

Questionamentos no STF

Pontos da lei trabalhista estão sendo questionados no Supremo Tribunal Federal (STF) por meio de Ações Diretas de Inconstitucionalidade, as chamadas ADIs, que aguardam por decisões dos ministros. Até o momento, foram julgados dois temas pelo Supremo: o fim da contribuição sindical obrigatória e o trabalho de grávidas e lactantes em atividades insalubres.

Entre as ADIs que faltam ser julgadas, a maior parte trata da modalidade de trabalho intermitente e limite de valores de indenização por dano moral. Entre os outros temas estão jornada 12×36 por meio de acordo, honorários de sucumbência, homologação da demissão sem a participação dos sindicatos e o reajuste de créditos trabalhistas e depósitos recursais.

Fonte: G1

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